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Fraude Nas Cooperativas

A partir dos anos de 1990, com a dinâmica de desprestígio oficial da relação de emprego e de desregulamentação e flexibilização da ordem jurídica trabalhista que tanto caracterizou aquela década, o corporativismo como fórmula alternativa de arregimentação e organização da força de trabalho no sistema socioeconômico capitalista do Brasil, ganhou forte presença na vida trabalhista.
Inicialmente por meio da Lei 8.949/94, a qual instituiu o parágrafo único do artigo 442 da CLT, abaixo transcrito, e quase dezoito anos após, pela Lei nº 12.690/12.

Art. 442 – Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego.
Parágrafo único – Qualquer que seja o ramo de atividade da sociedade cooperativa, não existe vínculo empregatício entre ela e seus associados, nem entre estes e os tomadores de serviços daquela.

Ocorre que apesar da expressa redação do dispositivo supra colacionado, não podemos considera-lo como uma excludente legal da relação de emprego.

O objetivo da lei foi retirar do rol empregatício relações próprias às cooperativas, mas desde que não comprovada a roupagem ou utilização meramente simulatória de tal figura jurídica.

De fato, a lei favoreceu o cooperativismo, ofertando-lhe presunção de ausência de vínculo empregatício, mas não lhe conferiu um instrumento para obter fraudes trabalhistas. Por isso, comprovado que o envoltório cooperativista não atende às finalidades e princípios inerentes ao cooperativismo, notadamente o princípio da dupla qualidade e princípio da retribuição diferenciada, fixando, ao revés, vínculo caracterizado por todos os elementos fático-jurídicos da relação de emprego (nos termos do artigo 2º e 3º da Consolidação das Leis do Trabalho), esta deverá ser reconhecida, afastando-se a simulação perpetrada

Sendo assim, na hipótese de fraude ter-se-á a formação do vínculo empregatício entre a empresa tomadora do serviço e o pseudo sócio/cooperado, seja no caso de contratação de serviços ligados à atividade fim mediante empresa interposta ou ainda pela contratação de serviços especializados ligados à atividade meio, desde que prestados com pessoalidade e subordinação direta.

Aplicável à espécie, portanto, a Súmula 331, item I, do Tribunal Superior do Trabalho, segundo a qual “a contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário”.

A criação e a promoção dos direitos sociais vêm de um longo processo de revoluções, questionamentos e pleitos, com o intuito de gerar a igualdade e dignificar a pessoa através de seu trabalho, proporcionando-lhe um processo de desenvolvimento e crescimento em todos os aspectos.

A figura das cooperativas surgiu como uma forma de economia solidária, com a missão de equilibrar a busca do lucro na economia de mercado em relação ao desenvolvimento social dos trabalhadores.
Contudo, na prática notamos distorções na utilização desta figura, tirando a pessoa do trabalhador do contexto de direitos básicos e vendo-a como mera mercadoria (mão de obra).

Por óbvio, o empresariado sempre irá almejar a redução dos custos de seu negócio, o fazendo por vezes inclusive em relação aos direitos básicos fundamentais do trabalho. Um dos subterfúgios empregados é a utilização das cooperativas com o fim de desnaturar vínculo empregatício.

Por este motivo a Lei 12.690/12 é considerada como o marco regulatório das cooperativas de trabalho, configurando-se uma espécie de moldura normativa buscando desestimular e coibir a utilização de cooperativas como mera intermediária de mão de obra. Traz em seu bojo elementos que constituem uma cooperativa lícita, conferindo aos sócios/cooperados suportes mínimos, praticamente igual aos direitos sociais dos trabalhadores em relação de emprego, tais como recesso anual, descanso semanal remunerado, dentre outros.

Evidente, portanto, que esta estrutura básica dignifica e humaniza a figura do homem em suas relações de trabalho quando realizadas na seara das cooperativas de trabalho.

*HEITOR EMILIANO LOPES DE MORAES E VITÓRIA DE TASSIS MANDELLI – Advogados associados da Marsaioli & Marsaioli Advogados Associados